A Palavra E A Energia...
– Conforme estudamos na noite de hoje, a palavra, qualquer
que ela seja, surge invariavelmente dotada de energias elétricas
específicas, libertando raios de natureza dinâmica. A mente, como
não ignoramos, é o incessante gerador de força, através dos fios
positivos e negativos do sentimento e do pensamento, produzindo
o verbo que é sempre uma descarga eletromagnética, regulada
pela voz. Por isso mesmo, em todos os nossos campos de atividade,
a voz nos tonaliza a exteriorização, reclamando apuro de vida
interior, de vez que a palavra, depois do impulso mental, vive na
base da criação; é por ela que os homens se aproximam e se ajustam
para o serviço que lhes compete e, pela voz, o trabalho pode
ser favorecido ou retardado, no espaço e no tempo.
Dentro da pausa ligeira que se fizera espontânea, simpática
senhora interrogou:
– Mas, para que tenhamos a solução do problema, é indispensável
jamais nos encolerizarmos?
– Sim – elucidou a instrutora, calma –, indiscutivelmente, a
cólera não aproveita a ninguém, não passa de perigoso curtocircuito
de nossas forças mentais, por defeito na instalação de
nosso mundo emotivo, arremessando raios destruidores, ao redor
de nossos passos...
Sorrindo bem humorada, acrescentou: – Em tais ocasiões, se não encontramos, junto de nós, alguém
com o material isolante da oração ou da paciência, o súbito desequilíbrio
de nossas energias estabelece os mais altos prejuízos à
nossa vida, porque os pensamentos desvairados, em se interiorizando,
provocam a temporária cegueira de nossa mente, arrojando-a
em sensações de remoto pretérito, nas quais como que descemos
quase sem perceber a infelizes experiências da animalidade
inferior. A cólera, segundo reconhecemos, não pode e nem deve
comparecer em nossas observações, relativas à voz. A criatura
enfurecida é um dínamo em descontrole, cujo contacto pode gerar
as mais estranhas perturbações.
Um moço, com evidente interesse nas lições, argumentou:
– E se substituíssemos o termo “cólera” pelo termo “indigna-
ção”?
Irmã Clara pensou alguns instantes e redarguiu:
– Efetivamente, não poderíamos completar os nossos apontamentos,
sem analisar a indignação como estado d'alma, por
vezes necessário. Naturalmente é imprescindível fugir aos excessos.
Contrariar-se alguém a propósito de bagatelas e a todos os
instantes do dia será baratear os dons da vida, desperdiçando-os,
de modo inconseqüente, sem o mínimo proveito para si mesmo ou
para os outros. Imaginemos a indignação por subida de tensão na
usina de nossos recursos orgânicos, criando efeitos especiais à
eficiência de nossas tarefas. Nos casos de exceção, em que semelhante
diferença de potencial ocorre em nossa vida íntima, não
podemos esquecer o controle da inflexão vocal. Assim como a
administração da energia elétrica reclama atenção para a voltagem,
precisamos vigiar a nossa indignação principalmente quando
seja imperioso vertê-la através da palavra, carregando a nossa voz
tão somente com a força suscetível de ser aproveitada por aqueles
a quem endereçamos a carga de nossos sentimentos. É indispensável modular a expressão da frase, como se gradua a emissão
elétrica...
E, ante a assembléia que lhe registrava os ensinamentos com
justificável respeito, prosseguiu, depois de ligeiro intervalo:
– Nossa vida pode ser comparada a grande curso educativo,
em cujas classes inumeráveis damos e recebemos, ajudamos e
somos ajudados. A serenidade, em todas as circunstâncias, será
sempre a nossa melhor conselheira, mas, em alguns aspectos de
nossa luta, a indignação é necessária para marcar a nossa repulsa
contra os atos deliberados de rebelião ante as Leis do Senhor.
Essa elevada tensão de espírito, porém, nunca deve arrojar-se à
violência e jamais deve perder a dignidade de que fomos investidos,
recebendo da Divina Confiança a graça do conhecimento
superior. Basta, dentro dela, a nossa abstenção dos atos que intimamente
reprovamos, porque a nossa atitude é uma corrente de
indução magnética. Em torno de nós, quem simpatiza conosco
geralmente faz aquilo que nos vê fazer. Nosso exemplo, em razão
disso, é um fulcro de atração. Precisamos, assim, de muita cautela
com a palavra, nos momentos de tensão alta do nosso mundo
emotivo, a fim de que a nossa voz não se desmande em gritos
selvagens ou em considerações cruéis que não passam de choques
mortíferos que infligimos aos outros, semeando espinheiros de
antipatia e revolta que nos prejudicarão a própria tarefa.
Do livro ENTRE A TERRA E O CÉU
Espírito: André Luiz
Livro - 051 / Ano - 1954 / Editora - FEB
Chico Xavier